O Código de Posturas da época do Império para os habitantes de Belém e povoações da Vila da Independência (Guarabira)
A referida lei,
um Código de Posturas do município, foi proposta pela Câmara Municipal da Vila
da Independência e aprovada pela Assembleia Legislativa Provincial, contendo 95
artigos sobre os mais variados assuntos pertinentes à organização das
localidades e do cotidiano da população, como alinhamento das edificações;
limpeza das ruas; atuação de médicos e boticários (farmacêuticos);
funcionamento de matadouros, açougues e feiras; manutenção de açudes públicos e
estradas; área para a agricultura e a criação de animais; jogos, brinquedos e
reuniões ilícitas; uso de armas; cobrança de impostos; e até como proceder com
pessoas “loucas”, embriagadas e mendicantes, além de obscenidades e ofensas
morais.
O Código de Posturas, aprovado no final do século 19, foi publicado na íntegra, em primeira página, pelo jornal O Liberal Parahybano, edição 194, em 19 de janeiro de 1884, tendo os nove primeiros artigos direcionados às normas para a construção e manutenção de residências e calçadas na Vila e nas Povoações, como também proibição de comportamentos considerados inadequados pela lei.
LEI
N. 749
DE
15 DE NOVEMBRO DE 1883.
José Ayres do Nascimento, bacharel formado em Sciencias Juridicas e Sociaes pela Faculdade de direito do Recife e Presidente da Provincia da Parahyba: Faço saber a todos os habitantes que a Assembleia Legislativa Provincial da Parahyba do Norte, sob proposta da Câmara Municipal da Villa da Independência, resolveu o seguinte:
Titulo 1º
DA EDIFICAÇÃO
CAPÍTULO 1.°
Art. 1.° O plano de edificação desta Villa e Povoações
do Município, em quanto não for tirada a planta das ruas, será o que for
determinada pela Câmara.
Art. 2.° Ninguém poderá edificar casas n’esta
Villa e Povoações do Município, sem que preceda licença da câmara e o
alinhamento dado pelo Fiscal.”
Centro da cidade de Caiçara em 1931. Na época da aprovação da Lei 749, em 15 de novembro de 1883, a Povoação de Caiçara pertencia ao território da Vila da Independência (atual Guarabira). Foto: Facebook Prefeitura de Caiçara.
“Art. 3.° Nas casas que se edificarem se observará o seguinte:
§ 1.° Serão de
tijolo ou pedra e cobertas de telhas.
§ 2.° A altura
da frente, a contar da soleira a base da cornija, será de quatro metros pelo
menos.
§ 3.° As portas
terão dois metros e setenta e cinco centímetros, as janelas 1 metro e setenta e
cinco centímetros, umas e outras a largura de 1 metro e vinte e cinco
centímetros. Se o prédio tiver maiores proporções poderá também ser aumentada a
dimensão das portas e janelas.
§ 4.° Os claros
terão nunca menos de cinquenta centímetros, nem mais de dois metros, em todo
caso serão simétricos.
§ 5.° Terão
cornijas ou platibandas, medindo estas a altura de um metro, e aquela cinquenta
centímetros, que, entretanto, poderão ser aumentadas proporcionalmente se o
prédio for mais alto.
§ 6.° Terão
calçadas de pedra ou tijolo nas frentes e travessas, com a largura de 1 metro e
cinquenta e cinco centímetros, excetua-se a parte da rua direita, entre as
casas de Francisco Herculano e Pedro Epaminondas, na qual deverão ter as
calçadas 1 metro e 11 centímetros. Em todo caso deverão estas conservar entre
si um certo declive, de modo a não ser preciso degrau ou rampas de umas para
outras.
§ 7.° As
frentes serão caiadas, coloridas ou guarnecidas de azulejo.”
Caso os proprietários não seguissem as recomendações da Lei, seriam punidos com multas de até 10 mil réis, moeda da época, conforme o artigo 4º:
“Art. 4.° Nas reedificações se observarão os mesmo preceitos estabelecidos nos artigos antecedentes. Os infratores de qualquer deles sofrerão a multa de dez mil réis e serão obrigados a demolir a sua custa o edifício na parte que estiver irregular, sendo para este fim acionados perante o juízo competente se não quiser demolir amigavelmente.”
Além das orientações para a edificação de residências, os moradores da Vila da Independência e das Povoações do seu território também deveriam se atentar para a maneira de organizar os materiais de construção na frente das casas. Uma das proibições, segundo o Artigo 5°, era deixar os materiais na rua sem ter um lampião acesso nas “noites de escuro”, talvez se referindo as noites em que não eram de lua cheia.
“Art. 5.° É proibido:
§ 1.° Ter
porta, janela, rotula ou postigo, que abram para as ruas, nos pavimentos
térreos.
§ 2.° Conservar andaimes nas ruas depois de
concluída a obra, ou estando suspensa, ou estando suspensa esta por mais de
três meses.
§ 3.° Ter
materiais nas ruas, sem conservar
durante as noites de escuro um lampião aceso.
§ 4.° Conservar
as frentes em preto um ano depois de concluídas as casas. O infrator sofrerá a
multa de oito mil réis.”
A Lei 749, de 15
de novembro de 1883, ainda determinava que os terrenos para construção de casas
deveriam ser murados e terem as calçadas feitas. Além disso, todas as casas
deveriam ser enumeradas. O descumprimento de tais normas acarretaria multas de
4 mil réis aos proprietários, de acordo com os artigos 6° e 7° do Código de
Postura municipal:
Art. 6.° Os foreiros de terrenos para edificação de casas são obrigados a edificar dentro de um ano, a contar da publicação da presente Postura, ou da data do aforamento, se for posterior, as frentes e calçadas pelo menos. O infrator sofrerá a multa de quatro mil réis, que será repetida todos os anos.
Art. 7.° As
casas serão numeradas, conforme determinar a Câmara, sob pena de quatro mil
réis de multa.
Com o título “desempachamento e limpeza das ruas”, o Capítulo 2 inicia com o Artigo 8° elencando seis incisos a serem cumpridos, obrigatoriamente, pelos moradores da Vila da Independência (Guarabira), da Povoação de Belém e demais povoações do município, com uma determinação curiosa que ainda remete à atual tradição nas semanas próximas à festa religiosa do Natal, que é a reforma ou pintura de casas:
CAPÍTULO 2.°
Desempachamento e limpeza das ruas.
§ 1.° A caiar,
colorir ou limpar as frentes e travessas das casas no mês de novembro de cada
ano.
§ 2.° A
conservar as calçadas sempre em perfeito estado.
§ 3.° A limpar
as testadas até o meio das ruas. Esta obrigação é extensiva aos foreiros de
terreno para edificação.
§ 4.° A varrer
aos domingos até as oito horas do dia as frentes e travessas na distância de
quatro metros. Ficam dispensados d’esta obrigação, que corre por conta da
Municipalidade, os moradores do pátio da Matriz, onde se costuma fazer a feira.
§ 5.° A entupir
buracos e charcos, que houverem nas frentes e quintais de suas casas.
§ 6.° A dar
saída pelo seu terreno as águas estagnadas nas ruas e quintais. Os infratores
serão multados em seis mil réis.
Já o Artigo 9°, do Código de Postura (Lei 749/1883), amplia as proibições para todos os moradores das Povoações do território da Vila da Independência. Alguns dos problemas, depois de 140 anos, ainda continuam causando transtornos nos dias atuais, como animais soltos ou entulhos nas ruas:
§ 1.° Lançar
entulhos nas ruas.
§ 2.° Fazer
escavações ou buracos.
§ 3.° Conservar
materiais de qualquer natureza, a não ser em frente dos edifícios em
construção, e sem prejuízo do trânsito público.
§ 4.° Ter solto
n’esta Vila e Povoações do Município animais cabrum, ovelhum ou suíno.
§ 5.° Amarrar
animais nas portas e janelas das ruas.
§ 6.° Andar a
cavalo por cima das calçadas.
§ 7.° Ter
fogareiro nas calçadas, ou qualquer outro objeto que dificulte o trânsito
público.
§ 8.° Amassar
cal ou barro nas calçadas.
§ 9.° Lançar
água servida nas ruas.
§ 10.° Escrever
ou riscar as paredes, portas e janelas das casas e muros, ou sobre elas lanças
imundície. Os infratores sofrerão a multa de quatro mil réis.
Finalmente, os Artigos 10 e 11, últimos da seção “Da Edificação”, tratam “dos edifícios ruinosos e insetos nocivos”, com uma determinação também curiosa para os dias atuais: os donos das casas eram obrigados a extinguir os formigueiros que aparecessem nas frentes das casas ou nos quintais. Essa exigência se estendia aos responsáveis pelos templos religiosos e edifícios públicos:
CAPÍTULO
3.°
Dos
edifícios ruinosos e insetos nocivos.
Art. 10. Se o proprietário de casa ou outro qualquer edifício, que ameaçar ruína, á juízo do Fiscal e de dois peritos nomeados pela Câmara, não quiser repará-lo ou demoli-lo no prazo de oito dias depois de intimado, será multado em vinte mil réis, e a Câmara requererá em juízo competente a demolição, que será feita á custa do proprietário.
Art. 11. Os donos de casas n’esta Vila e Povoações do Município, e em sua falta os inquilinos, ficam obrigados a extinguir os formigueiros, que aparecerem nas respectivas casas, frentes e quintais, sob pena de vinte mil réis de multa. Ficam sujeitos a mesma obrigação e multa os procuradores das Igrejas e da Câmara Municipal com relação aos templos edifícios respectivos.
A partir do Artigo 12, o Código de Posturas segue com mais determinações para todos os habitantes da Vila da Independência e de suas Povoações, como Belém, Caiçara, Serra da Raiz e Mulungu, citadas nominalmente no regulamento anexado à Lei 749/1883, sobre os Fiscais das Povoações responsáveis por fazer cumprir a referida lei.
Recorte do jornal O Liberal Parahybano, 1884.
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