Padre José Tavares e a doação das terras onde foi construída a cidade de Belém/PB

Marco zero da cidade de Belém, onde está construída a Igreja Nossa Senhora da Conceição, 2017. Foto: DR Filmes.

Antes de Belém configurar-se em um pequeno aglomerado urbano, com formato de cruz, no final do século 19, e chegar à categoria de Município no ano de 1957, o território compreendido pela atual sede municipal era composto de núcleos rurais com habitações esparsas, sendo, alguns desses locais, paradas obrigatórias para o descanso de tropeiros e viajantes que se dirigiam às principais feiras livres da região, a fim de comercializarem produtos agrícolas e seus derivados.

Dentre os registros oficiais mais antigos sobre o povoado de Belém, e que indica a divisão em pequenos núcleos rurais, destaca-se a certidão do Joel Baptista da Fonseca e Tabellião Publico e Official do Registro de Immoveis, do Termo de Guarabira, datada do ano de 1935, referente à escritura de doação de uma parte de terras do Reverendo Padre José Tavares Bezerra para a Capela Nossa Senhora da Conceição, da povoação de Belém, em 06 de fevereiro de 1871.

De acordo com o teor da escritura de doação do terreno, pertencente ao Padre José Tavares Bezerra, os limites das terras doadas eram compreendidos entre o sítio do Tenente Luiz Francelino e as casas de Pedro Ferreira, de Cândido Baraxo, do Alferes Francisco Camillo e do morador chamado “Gervasio de tal”, como pode ser verificado, a seguir, em trecho lavrado, originalmente, do referido documento obtido nos arquivos da Paróquia Sagrada Família de Belém:

Escriptura de doação que faz o Reverendo Padre José Tavares Bezerra, de uma parte de terras, a Capella de Nossa Senhora da Conceição da povoação de Belém, pela quantia de quinhentos mil reis na forma abaixo. SAIBAM quantos este publico instrumento de escritura de doação virem, que no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Chisto de mil oitocentos e setenta e um quinquagesimo da Independencia e do Imperio do Brasil, aos seis dias do mês de fevereiro nesta Villa da Independencia Comarca de Mamanguape provincia da Parahyba do Norte, e em meu cartorio  onde eu Tabelião me achava, por me ser distribuida esta escriptura, ahi perante mim e as duas testemunhas abaixo assignadas, appareceram o Reverendo Padre José Tavares Bezerra, morador na povoação de Belém deste Termo, e de outra o promotor de Cappelas Juvencio Nunes Pereira, morador nesta Villa, reconhecidos pelos próprios de que faço menção e dou fé; e pelo primeiro foi dito perante mim e as mesmas testemunhas, que de sua propria e livre vontade, por senhor e possuidor de uma parte de terras sita na povoação de Belém deste Termo com as dimensões e limites seguintes: principiando da barra dois riachos que vem do sitio do Tenente Luiz Francelino, e outro que vem do Olho dagua de Pedro Ferreira em linha recta para o poente, até a baixinha da estrada entre a casa de Candido Baraxo e a casa que foi do Alferes Francisco Camillo: e dahi em linha recta até o riacho Picada, e descendo por este até a casa de Gervasio de tal, e dahi em linha recta para o nascente a passar na Alagoinha do Lagedo grande até o riacho que vem do sitio do mesmo Tenente Luiz Francelino, e por ele acima até o mesmo ponto da barra dos dois riachos, fazia da referida parte de terras doação pura e irrevogável a Capella de Nossa Senhora da Conceição de Belém de cujo patrimônio ficará fazendo parte de hoje para sempre, pois que elle dito doador dimitia de toda acção e posse, e servidão activa que tem tido na referida parte de terras, e traspassa para o domínio da dita Capella de Nossa Senhora da Conceição de Belém. [...] (Joel Baptista da Fonseca e Tabellião Publico e Official do Registro de Immoveis do Termo de Guarabira, etc. Certidão. Guarabira, Janeiro de 1935, p. 1).

Cópia da Certidão sobre a doação de uma parte de terras do Padre José Tavares Bezerra à Capela de Nossa Senhora da Conceição de Belém.

Tomando como base a descrição da terra doada, a “barra dois riachos” é o ponto de encontro dos riachos que vem dos sítios Lagoa de Serra e Grotão, até o trecho da Rua Clóvis Bezerra, chamado de Cancão, próximo à Escola Municipal Anita de Melo, inclusive parte das ruas por trás da referida escola, descendo pela rua da Escola Municipal Professora Elvira Silveira, em direção ao Riacho Picada; do riacho, segue até o Cemitério Público, onde ficava, nas proximidades, a “casa de Gervasio de tal”.

Desse ponto, ou seja, das proximidades do cemitério, segue até à atual Cadeia Pública, na “Alagoinha do Lagedo grande”, atravessando a rodovia estadual e seguindo pelo riacho que vem do Açude Tribofe, ou “o riacho que vem do sítio do Tenente Luiz Francelino”, finalizando na “barra dois riachos”. Portanto, uma grande área onde hoje está situada quase que a totalidade da cidade de Belém, como pode ser observada na imagem abaixo, a qual abrange a parte de terras doada no século 19.

Vista parcial da cidade de Belém, 2017. Foto: DR Filmes.

Ainda sobre o Padre José Tavares Bezerra, ele deixou seu nome gravado na memória histórica de Belém por ter oficializado, em 1871, como dito acima, a doação do terreno onde atualmente está localizada a sede do município. Com relação ao padre, que dá nome a uma rua ao lado da Igreja Nossa Senhora da Conceição, a versão do Sr. Manoel de Oliveira, “Seu Manuca”, diz que:

“Padre José Tavares não era padre daqui não, era de Guarabira. É que nessa época Belém pertencia a Guarabira, e era dirigida pela Paróquia de Guarabira, a Freguesia era de Guarabira, depois com o tempo passou pra Serra da Raiz, e depois pra Pirpirituba. Esse terreno da igreja, meu pai contava, era de um rapaz velho que morava aqui em Belém. Agora não me lembro do nome dele. E esse rapaz velho era muito religioso. Naquele tempo, terra não tinha valor, aí antes dele morrer ele doou esse terreno para a Igreja, pra Nossa Senhora. Era uma base de 124 quadros de terra ou 130, era uma coisa assim, era muita terra. Você veja que a cidade de Belém todinha é dentro desse patrimônio. Só que o povo roubou um bocado, muitos tomaram parte da terra, mas era muita terra a do patrimônio. Nessa época que ele deu, Belém, que era Gengibre, era dominado por Guarabira e esse Padre José Tavares morava em Guarabira. Quando ele deu esse terreno então foi o Padre José Tavares que passou o documento do terreno para Nossa Senhora, para a Igreja, com a assinatura dele, porque ele era o vigário que representava. Então tinha que ser a assinatura dele, assinado Padre José Tavares. Quem deu mesmo foi esse senhor velho que morava em Belém. E esse mesmo senhor que deu essa terra a Nossa Senhora, esse mesmo senhor, dentro da igreja, no dia de Nossa Senhora da Conceição, na hora da missa, morreu dentro da igreja. Foi enterrado num cemiteriozinho velho que tinha lá perto de Galego do Queijo” (Manoel de Oliveira, agricultor, 72 anos de idade na entrevista concedida em 2008).

Nas notas históricas sobre Belém, do Sr. Francisco de Assis Porpino dos Santos (in memoriam), popularmente conhecido por D’Assis, o doador do terreno à Igreja Católica seria Gregório Tomaz de Aquino, antigo morador do povoado e que também dá nome a uma rua próxima à Igreja da Conceição:

[...] o Padre José Tavares Bezerra [...] doou o terreno para a construção da primeira Igreja, que seria em homenagem a Nossa Senhora da Conceição, desmembrado de terras que recebera de presente de um antigo morador do local, de nome GREGORIO TOMAZ DE AQUINO. [...] Hoje tem seu patrimônio com área de 80 hectares e dentro dessa possessão está à cidade encravada (SANTOS, Documento Manuscrito, S/D).

Contudo, não se tem certeza se Gregório Tomaz de Aquino foi o doador original da terra recebida pela Igreja Católica, e oficializada pelo Padre José Tavares Bezerra, em 1871, ou se ele, posteriormente, teria adquirido e doado apenas o terreno onde foi construída a Igreja Nossa Senhora da Conceição, o que parece mais provável, pois o nome de Gregório Tomaz de Aquino não consta na escritura de doação da “terra da santa”.

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